Da virtude em política - Por Alain Garrigou, 22 março 2017

Disponível em: http://blog.mondediplo.net/2017-03-22-De-la-vertu-en-politique

Tradução livre





MIOLO


A construção democrática se realiza com a imposição de uma virtude política. Como fazer viver a relação de representação se, de uma parte, os eleitores são corrompidos pelos favores e presentes – a menos que ao inverso eles cedem às pressões – e si, de outra parte, os candidatos subornam seus poderes para se enriquecer? Essas duas armadilhas simétricos definem desde a origem duas condições a serem cumpridas afim de que a democracia representativa não seja demais tendenciosa. 



Se a primeira condição parece adquirida, a segunda permanece problemática. O caso Fillon a mostrou sob vários aspectos: a contratação de uma esposa como colaboradora parlamentar para um trabalho que parece ter sido sobretudo o de dona de casa [1]; a remuneração desta última por uma revista da qual o proprietário é um amigo do marido – nesse caso, tratava-se de corrupção pura e simples; o emprego de crianças; e enfim a existência de uma sociedade de conselho que aflora o conflito de interesses (notadamente com a campanha de assegurar Axa do qual o antigo PDG é um apoiador declarado de M. Fillon [2]), tanto é difícil de crer que os conselhos que ela esbanja merecem as somas pagas ... quando bem mesmo se trata de colocar em relação o presidente russo com homens de negócios [3].

Essas práticas, todos começam a perceber, não são realmente excepcionais. Quarta 21 de março, um novo caso de nepotismo forçou o ministro do interior, Bruno Le Roux, à demissão. Quanto à candidatura da Frente Nacional para eleição presidencial, ela já foi penalizada pelo Escritório Europeu de Luta Antifraude por cargos fictícios de assistentes parlamentares [4].

Se a questão da virtude política se coloca hoje frequentemente, isso é porque ela é sem dúvida mais difícil de se instaurar pelos representantes, que para seus modestos eleitores, quem não tem grande coisa para vender.

Les pare-feux ne sont plus suffisants (à supposer qu’ils l’aient jamais été). 


Uma primeira tentativa de paliar essa falta de virtude foi a instituição da compensação legislativa, muito precoce na França porque ela foi adotada desde o 1o de setembro de 1789. Ela o será mais tardiamente em outros países cujo regime tinha uma característica mais aristocrática, como o Reino Unido onde esta compensação foi adotada apenas em 1911. Evidentemente, uma vez o princípio admitido, restaria por fixar o montante. Um montante suficiente para permitir viver da política, salvo para excluir antecipadamente do exercício de um mandato político todos aqueles que não foram reformados (seja, conforme os termos de Max Weber, permitindo um recrutamento não plutocrático de pessoas políticas), mas também para os proteger das tentações da corrupção. Não é simples quando, deixando a estabilidade monetária, foi necessário reavaliar o montante desta compensação legislativa. Por força de polêmicas, o Parlamento adota em 1938 uma medida de alinhamento automático sobre os salários da alta função pública.

Este processo discreto é ainda adotado ou, talvez mais diretamente, a compensação assim fixada (hoje 7 de março, 185,60 euros brutos mensais) é ela suficiente? Poucos parlamentares ousam colocar a questão. Eles preferem adotar certos processos, alguns diriam truques, para aumentar suas rendas. Durante muito tempo esse foi a acumulação de mandatos, mas esta solução tornou caduca. O emprego remunerado de uma esposa ou de seus filhos como assistente parlamentar – para um trabalho fictício ou não – tornou-se frequente. A insuficiência da compensação apareceu ainda mais cruel que ela diminui relativamente, pelo fato de seu alinhamento sobre a evolução dos salários da função pública, esta diminui desde uma dezena de anos. Não sem brincadeira, a austeridade penalizou seus próprios autores. Por outro lado, esta diminuição da compensação é principalmente relativa ao crescimento das diferenças de renda. Então frequentam mais ricos que pobres, os dirigentes políticos ressentem fortemente como fracos seus rendimentos, e de mais em mais fracos.

Lutar contra a corrupção pela representação legal. 


A julgar pelos casos que marcaram a República desde os anos de 1980, inclina-se claramente por concluir na impunidade dos dirigentes políticos. Quantos foram condenados, mesmo levemente, tendo em conta as infrações comprovadas? Tão pouco que esta impunidade tem fortemente encorajado as infrações, que são banalizadas. O caso Cahuzac mudou talvez isso, menos pela amplitude da falta que por sua natureza: o ministro cometeu um autêntico delito político porque ele condenaria a fraude toda em condenando ele mesmo, mas sobretudo porque ele mentiu para seus pares com calma e não há pior crime: mentir para a imprensa, ao presidente da República e diante a Assembleia Nacional. Depois de muitas outras leis destinas a colocar um termo na corrupção, a criação do ministério público nacional financeiro em 2013 mudou talvez as coisas: a lista de dirigentes políticos recentemente condenados – e mesmo duramente, com penas inéditas de prisão como Claude Guéant – sugerem uma reviravolta. Não obstante a rapidez dos processos, rompendo felizmente com atrasos tão longos que equivaliam a funerais programados – onde se espera que os incriminados morram.

Desprofissionalizar a política. 


Quando a busca e o exercício de responsabilidades políticas todas eram apresentados sobre o modo da vocação, são efetuadas por profissionais que jamais exercem outra profissão que senão a profissão política, sendo que os projetos e ambições de outras profissões se convidam mais facilmente em política. Especialmente que trata-se de uma atividade de dominação onde se afirmam forçadamente as ambições de carreira. Por que o enriquecimento seria ele excluído? Principalmente se participa pessoas afortunadas. Ao ponto que um antigo presidente da República como Nicolas Sarkozy, manifestamente sensível a esta dimensão, poderia exprimir publicamente sua admiração pelos ricos evocando por alta voz uma outra vida por ele mesmo. O sonho de sucesso social pela política é muito encorajada pelo profissionalização que toma a forma de um desejo de vida nobre – como Jacques Chirac o realizaria em comprando o castelo de Bity, ao grande desgosto de seu patrono, o primeiro ministro Georges Pompidou, ou como François Fillon o fez em adquirir a mansão de Beaucé – ou ele se volta para outras ambições mais cosmopolitas e exóticas.

Decididamente, a financeirização do mundo carrega tudo sobre sua passagem, e bem claramente os velhos valores altruístas do serviço público. Levou esperar a virada para o século XXI para que ocorresse “o reino de interesse nu” que Marx anunciou mais cedo – há um século e meio – porque essa foi verdadeiramente uma profecia.

Alain Garrigou


[1] Lire aussi « Le châtelain et la châtelaine », Le Monde diplomatique, mars 2017.
[2] Lire François Denord & Paul Lagneau-Ymonet, « De qui François Fillon est-il le prête-nom ? », Le Monde diplomatique, février 2017.
[3] Une intercession qui aurait rapporté la somme de 50 000 dollars à François Fillon, d’après une information du Canard enchaîné (22 mars 2017) aussitôt démentie par le Kremlin.
[4] Voir Maxime Vaudano, « Les trois affaires qui menacent Marine Le Pen et le Front national », LeMonde.fr, 2 février 2017.




Ler também Perry Anderson, « Bouillonnement antisystème », Le Monde diplomatique, mars 2017.

er também Mona Chollet, « L’art de faire rêver les pauvres », Le Monde diplomatique, avril 2008.

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